Page 6 - Agenda Municipal de Novembro | Dezembro
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Sabia que...
                                             Ano de 1891

                                             28 Setembro
                                                “Num dia de grande temporal, o Dr. Manuel de Arriaga, que se encontrava
                                             veraneando na Nazareth, foi até à praia do norte e perante a fúria e majestade dos
                                             elementos  revoltosos,  compôs  uma  sen mental  poesia,  inspirada  no  quadro
                                             horrivelmente belo, a que assis u.”
   6                                         In, A Nazaré – Coisas Ouvidas, Lidas e Vistas por José Pedro, Extractos do Jornal “O Mensageiro”,
                                             Caderno N.º 1 – 1683-1919, Arquivo da Biblioteca da Nazaré.


                             ...o nosso
                                             N´um dia de Temporal
               primeiro Presidente
                                             Venho de novo consagrar-te a lyra
                       da República,         Ó grande mar! Minha alma que te admira,  Se n´essa lucta ingente em que trabalhas,
                                             Que  em  guerra  ao  mal  e  em  prol  do  bem   Ao ribombar d´innumeras batalhas,
                 Manuel de Arriaga           conspira,                         Em pó os con nentes esmigalhas,
                                             Gosta de ser qual és!                         Pavoroso Titan!
              gostava de vir passar                                            Outros mundos levantas superiores,
                                             Sob o tecto marmóreo d´esta gruta  A quem o sol, cobrindo d´esplendores,
                  férias na Nazaré?          Apraz-me vêr-te ahi em gruta lucta,   Enche de luz, de musicas e flores,
                                             Qual rábido leão de crina hirsula                  Mal irrompe a manhã!
          E que escreveu poemas              A rugir a meus pés!               Somos qual és: minando a consciência,

        que exaltavam as belezas             Tão colossal, colérico, estupendo  A terra, os ceus, a própria Providência,
                                             Surge ás vezes, como se fazendo   Com arte, engenho, amor e sapiência,
                    naturais da vila?        Úl mo esforço, queiras monstro horrendo!  Qual mãe gerando a prol!
                                                                               O genio humano, audaz e sublimado,
                                                                 Supplantar afinal
                    Um que merece            Este povo de heroes,que, em frágil lenho,  Vae derruindo os mundos do passado,
                                                                               Afim de erguer um outro illuminado
                                             Sobre   aprendeu a ser tamanho
                    mais destaque é          Em valor e riqueza, em arte e engenho  D´um mais fulgente sol!
                                                                               Afins nos fez a mão da natureza;
                                             Que outro não houve egual!
        “N´um dia de Temporal”,              Quem vos impele, ó ondas triumphantes  Sem receio podemos com certeza
                                             D´encontro a mim? Impavidos gigantes,
                                                                               Um pelo outro medir nossa grandeza,
                   onde revela com           Porque na vossa fúria trovejantes  Orgulho e condição!
                                                                Terra e mar abalaes?!
                                                                               Ergue-te aos ceus terrivel, brama e espuma
       belas palavras a beleza da            Em que ponto da abobada infinita   D´encontro à rocha as ondas uma a uma,
                                                                               Que eu só em   encontro quem resuma
                                             O espírito desceu que vos agita,
                     Praia do Norte.         E obriga-vos a erguer aos ceus em grita,  Minha alma e coração!
                                             Vossas massas coraes?!
                                                                               Ah! Se emquanto rodar no espaço o mundo,
                                                                               Terá jamais descanço um só segundo
                                             Ante al loqua voz d´este concilio,  Teu coração pacifico e iracundo,
                                             Nem tem pres gio os cantos de Virgilio,  Eterno luctador!
                                             Quem em vão buscava ler! Ah! N´este exílio  Se é dado a quem é triste aos ceus se carpa,
                                                    Meu mestre és tu ó mar!    Desfere, ó mar, nas cordas da tua harpa,
                                             Crente do bem que em mim se acusa e sigo,  D´encontro aos alcan s da negra escarpa,
                                             Venho de quando em quando ter com go,  A tua imensa dor!
                                             Como aquele que busca em peito amigo
                                                  A dôr desabafar!             Cap vo aqui me tens, horas e horas,
                                             N´este teu grandiosíssimo espectaculo,  A ouvir-te as grandes ondas rugidoras,
                                             Como o crente escutando a voz do oraculo,  Como à voz de benéficas mentoras!
                                             Ouço a onito o espirito vernáculo,  Tens para mim tal dom,
                                                                O verbo inspirador,  Que na aridez das minhas rudes lidas,
                                             Com que a sabia natura, a ar sta, a mestra  Em contacto com almas prever das
                                             De todos nós, com mão hábil e destra,  Venho de   recuperar forças perdidas,
                                             Instrumenta na tua enorme orchestra  E saio forte e bom.
                                                           O odio, a cólera, o amor!
                                             Meu peito e tu ó mar, dois grandes mundos!
                                             Encerram ambos pélagos profundos,               Nazareth, Setembro 1891
                                             Virtudes e paixões, ambos fecundos
                                             Nas luctas contra o mal!
                                             Como tu, eu me irrito, eu bramo, eu choro,
                                             Faço e desfaço os ídolos que adoro,
                                             E passam como rápido meteoro
          Dr. Manuel de Arriaga - 1º Presidente da República,
              in, Brasil-Portugal: revista quinzenal ilustrada,   Á busca do ideal!
                       n.º303, 1 de Setembro de 1911,
                  Arquivo da Hemeroteca Digital (Lisboa).
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